terça-feira, 30 de setembro de 2008

(188) A posse

Quando um Domingo me apanha na capital, ofereço-me uma fatia do dia, pequena seja ela, a deambular na Ribeira e sua feira de coleccionismo.
Mais cusca que comprador, miro e remiro as bancas dos vendedores de supérfluo. Das moedas aos pacotes de açúcar, dos selos às caixas de fósforos, postais e quejandos.
Certo tenho eu: o valor das coisas está na razão directa do desejo da sua posse.
E a posse é uma estranha figura, sinistra até, oferecendo uma aparente sensação de domínio e exclusividade, tanto mais agressiva quanto o objecto da posse mostra sua inutilidade na concretização do acto de viver e ainda carece de cuidados na sua manutenção e guarda.
A coisa é sofregamente adquirida, classificada, sistematicamente arrumada, por vezes escondida de olhares estranhos, apenas revista quando agregada companhia ou na ressaca de uma qualquer nostalgia.
O valor real e material da coisa apenas existe na mente do seu possuidor,
além dos valores também relativos que outros lhe possam atribuir, sendo assim fraca a sua função vital.
Sendo humano, (serei !?!?), negou-me a natureza a fuga a esta servidão
Quando jovem sofria ao desejar coisas fora do meu alcance material. À revolta contrapus resignação e disciplina. Dei assim a volta e hoje, podendo possuir essas coisas, refuto-as por inúteis.
Dizem-me estar no átrio do paraíso por me limitar, com raras excepções, às primárias necessidades da sobrevivência.
Tenho ainda um senão.
Dispondo de algum espaço, não deito coisas fora, conservo mas esqueço.
As coisas acabam por não cumprir a sua malévola função e decerto não me possuem.

2 comentários:

alcinda leal disse...

Prof vi-me aflita para ler o seu texto,porque , não sei por que oculta razão, o computador bloqueia!
Tão ocupada estive com isso que não tomei a devida atenção ao texto que, com certeza, será bom!
Na minha ignorância pergunto: o que se passará com o seu blogue que me bloqueia sistematicamente?
Um abraço da Alcinda

Anónimo disse...

Vim da leitura do seu rebuscado texto, mas também o fotógrafo está em grande. Bom pormenor.
Um abraço.