quinta-feira, 31 de julho de 2008

(169) Exterminadores



A desinfestação resulta duma sociedade onde impera a lei da sobrevivência e não fora o desequilíbrio de forças, desiguais e mal distribuídas, seria lógica e justa, na medida de ser esse o impulso de qualquer ser vivo.
Acabam por subsistir não os mais invasivos, antes os aparentemente melhor protegidos pela natureza.
Os supostos donos da razão e do polegar oponivel.
Sempre sob o baluarte do efeito épico ou ilustre, de cognome os bonzinhos, estende-se a exterminação até aos da mesma espécie.
Nas Cruzadas era intento expulsar os infiéis; na Alemanha apurar a raça... e antes... e depois... e qualquer dia.
E tudo isto porque o cordeiro, a beber a jusante, contamina a água que o lobo bebe a montante, numa visão egocêntrica do próprio umbigo.
Todavia a teclagem já vai longa e o intuito era alertar para um solitário especialista da exterminação.
O ser apaixonado com uma visão do amor eterno e contagioso, exigindo na permuta igual paga, esquecendo do outro a diferença, a mediação, sentimentos paralelos, não escutando suas falas, nem interpretando seus escritos.
É um perito no uso de produtos altamente sofisticados e dolorosos, com suaves nomes de perfume: obstinação, perseverança, fantasia, ilusão, teimosia e muitos outros.
Não conseguindo a totalidade do amor, actua e, além dos danos colaterais, danifica esse amor, vassoura o sexo e a amizade, esquecendo ser esta a fonte, onde, na essência, vão beber todos os sentimentos nobres.
E, bizarro porém histórico, após o morticínio, considera-se dono da razão e candidamente inocente.
Cuidem-se !!!

terça-feira, 29 de julho de 2008

(168) Crenças

... e convicções
Quando se está atento, as mesas ao lado são excelentes emissores.
Não resisto e me perdoem a cusquice !

- Deus existe ?
- Claro, é a nossa luz, o nosso guia na sua infinita bondade !
- Então porque sofremos ?
- Pode suceder, quando está cansado.

quinta-feira, 24 de julho de 2008

(167) Outros seres

fotocantodocarlos

Outros seres do mundo do silêncio

Lá tive de passar mais vinte e quatro horas na grande balburdia, por sorte, sete delas a dormir.
Tento perceber este meu desapego à grande urbe onde nasci e em desilusão vivi a idade das ilusões.

A meu favor, dois argumentos lhe juntei hoje: a óbvia integração numa população deveras envelhecida e a falta de identificação ao lidar com o facto.

Dito doutro modo: "sendo os jovens belos uma criação da natureza; os idosos belos criam-se a si mesmo". A minha dificuldade mora em constatar, entre tantos, quão poucos são.

Nos transportes públicos, a algazarra e a falta de respeito ao outro, fizeram-me invejar esse maravilhoso mundo do silêncio, habitado por seres belos, insinuantes, distintos, porventura também devorando-se entre si, em silêncio porém.

(166) Quem és ???

Plim-plim Sinal de mensagem.
Não conheço o número nem me interessa conhecer.
Mensagem anónima, pois, questionando: quem és ???
Normalmente apago e esqueço. Não foi o caso.
A duvida e incerteza é de constância avivada.
O próprio perfil do blog nos impinge o quem sou, questão que tentamos iludir, capeando-a de ses e talvez, no fundo a esconder a tremenda ignorância.
Respondendo, diria "nada", para não plagiar o outro que apontou e disse "ninguém".
Ou talvez, quem sabe, seja uma mal arrumada pitada de poeira cósmica que o vento em breve espalhará.
Continuarei na penumbra, mas valeu esta mensagem!!!
Bem haja.

sábado, 19 de julho de 2008

(165) Seres pensantes



A viagem d'hoje, sobremaneira me agradou.
Nem sei a razão. Talvez por ter ido ontem e ansiasse o retorno.
Começo a temer o dia em que, ao lá chegar, não tenha jeito de ficar e regresse no mesmo expresso, deixando por cumprir as obrigações absurdas duma vida finita.
No percurso, olhando os campos prenhes do esforçado e humilde labor do homem, permito-me duvidar da sanidade do chefe de orquestra da natureza.
Porventura, a criação do dito humano não seria problema se os limites fossem semelhantes aos concedidos a outros e tão maravilhosos seres que por aí habitam e com alguns dos quais até uso e abuso privar.
Quis todavia ensaiar o insólito e concedeu a esta criatura a faculdade de pensar.
E daqui não mais teve mão na harmonia.
Nem batuta obedecida.
Logo se apercebeu.
Uns aproveitaram em demasia, outros não tanto e houve até alguns que, sabiamente talvez, rejeitaram o beneficio.
Esses, não pensadores, integraram a escola geral, o instinto lhes basta, continuando a tocar o seu instrumento e, sem opinião, pouco entravam o processo harmónico.
Os pensadores medianos, demasiado contestatários, arrogantes, dizem se pensam logo existem e daí causam perturbação quanta baste nos acordes, tocando cada um a seu belo prazer.
Os demasiado pensadores, necessariamente pessimistas, logo desistem, tornando-se prejudiciais ao conjunto, pela falta de entrada a seus tempos.
A balburdia é agravada pelo facto de não ser linear o preceito.
Entre existentes e desistentes, como em tudo, são extensas as zonas cinza, nem branco nem negro, acolhendo os pensadores menos convictos da sua opção.
O grande maestro, incapaz de regredir nos seus favores, estará de todo arrependido e receoso duma eventual paralisação da sua antes bela sinfonia.
Para quando ? Resta saber!!!
Tudo me foi contado pelas arvores enquanto ondulavam, acenando o seu adeus à passagem do autocarro.
Aqui fica o relato, convicto de não estar a cometer indiscrição.

quarta-feira, 16 de julho de 2008

(164) Recados

Não lamentes.
É o primeiro passo na descrença.
E a verdade sempre nos confunde.
Eu sei.
Aprendi noutras lutas, noutras batalhas, noutras derrotas
Perdendo o medo e com ele a esperança.
Deixei de ler. Deixei de chorar.
Contentam-me os despojos da memória,
essa implacável amiga.

Há muito não te dou um abraço. Fica bem; na luz.

terça-feira, 15 de julho de 2008

(163) LÁ DO FUNDO

Era intenção "LÁ DO FUNDO" ir revendo alguns textos do passado e assim funcionou até agora.
Para não se perderem entre os outros, passaram esses textos a ser lincados à esquerda do blog na rubrica "Pescando no passado" e ali podem mais facilmente ser visitados.
Este texto não foi eliminado para manter os comentários.

segunda-feira, 14 de julho de 2008

(162) Outros tempos



Homens poderosos
Imitando a bravura do animal

Posted by Picasa

sexta-feira, 11 de julho de 2008

(161) Amores imperfeitos

Não via o Julião há dois anos.
Gosto deste tipo e sinto o seu fado, talvez por ser capaz de lhe vestir a pele.
É ele assim um rapaz da minha idade, de muita pedra partida,.
Quando levou a pancada da viuvez, deambulou e, nos anos seguintes, fechou-se nele sem tentar sequer, por ser tarde ou não, procurar companhia.
Meio destroçado, parecia contudo bem assente na sua cimentada solidão, continuando a usar velhos remos, singrando, horizonte à vista, no mar do resto da vida.
Dizia que para ele o sexo morrera, acrescentando “e já era tempo”.
Neste reencontro leio tristeza no olhar, mais quebrado, esfomeado de se fazer ouvir e, de meu hábito, ali estava eu pronto a saciá-lo com o pão da minha escuta.
Finalmente conhecera alguém e, duvidoso do próprio desempenho, foi sem convicção acabar na cama, não propriamente para dormir.
Aos poucos acabou por se convencer que afinal o sexo apenas hibernara, surgindo agora em edição envelhecida, quiçá melhorada.
Entendiam-se. Dava certo. E da habituação passaram ao teste das compatibilidades e afinidades, coisa que o Julião entende correu na inversa e deveria ter sido o primeiro passo.
E, para não estender o relato, de imediato descrevo o sintético perfil que dela traçou .
Sensível e crente, demasiada crença, aceitando sem discussão ser o homem rei da criação.
Grande apreciadora de touradas, não vendo nelas a crueza do acto e aceitando que afinal os touros estavam aqui para isso.
Na roupagem, fervorosa devota dos Vuiton, Gucci e outros que, impondo a moda, não dão lugar à individualidade.
Senhora e sonhadora de andanças e viagens em que muitas andara.
Amante da mesa, perfeita no detalhe, convicta que ali se cria a identidade e, por tal, com alargada convivência social.
Desejosa de alargar o conhecimento da relação a familiares e amigos, como se, em idade tão adulta, os outros tivessem algo a ver com o encontro dos dois.
Ansiando por uma vida em comum, coisa arredia do Julião que, na verdade, nem já conseguia dormir acompanhado na real acepção do termo.
Se aceitar este sintético perfil e situar nele o que conheço deste meu amigo, poderia dizer, também sinteticamente: seria como se estivessem na linha do equador, ambos a alta temperatura, mas diametralmente opostos; estilos de vida arreigados, óbvia e praticamente inalteráveis no declínio.
O homem de vida simples que é o Julião, reconhece até ser possível que o ideal more no outro extremo e nem uma palha mexeria para que ela mudasse mesmo viesse isso a ser possível. Não queria, conhece a vida.
No seu âmago e por seu feitio, gostaria continuar amigo.
Nunca gostou de morder a mão que lhe faz festas.
Ela não o permitiu, acusando-o de brincar com os sentimentos dos outros e ser pessoa de usar e deitar fora.
Foi a gota de água e a lamina afiada que introduziu a duvida.
E questionou-me ele:
—Será essa a imagem que passo aos que atravessam a minha vida ?
Dei-lhe um abraço, beijei-o e disse-lhe:
— Não, não és assim. Eu sei e tu também.

quinta-feira, 10 de julho de 2008

(160) Arte e Manha




Amigo do peito, há muito saído da roda da vida, de presente me fez um pequeno e belo dicionário ilustrado.
Aprecio a branda e lenta evolução, sem abandonar costela conservadora, e depois gosto de bonecos.
Bonecos, objectos, coisas, são parentes próximos dos actos e sempre superam as palavras.
Ao aceno, esse pequeno grande gesto e suas fortuitas intenções, corresponderão mil palavras e, todavia, é tão simples, maravilhoso e insinuante, esse manejo da mão, mesmo quando aparentemente nos manda a qualquer lado onde não fazemos intenção de ir.
Por isso, pesem embora, as décadas do tal livrinho, ali continuo a beber, no permanente borrifo aos acordos e diferenças.
Sou descuidado no acento, na rima e concordância, às vezes por manigância.
Na escrita deixo a arte aos eruditos e continuarei manhoso enquanto tal me der gozo.

(159) Consolo


Afinal existem bruxas ?
Um diz não crê, outro indeciso queda.
Por mim, mais preciso vou ser.
Como justificar dias cinza-negro e sem sentido, fazedores de desespero ?
Madrugada ainda alta, chegam eles sem pré aviso ao abrir do olho esquerdo e, logo, vontade e animo mal conseguem aquele sono interromper.
Mas enfim lá tem que ser ...
Com alimento e janotas, mais a lista d'afazeres, sai o arranque da saga.
É a espera; o ainda não; o não está cá; o venha amanhã; o transito; a balburdia e o constante vai e vem do eterno faz de conta.
As negas já sedimentam desanimo e desespero e, se a tarde for assim, nem o almoço cai bem.
Nesses dias cinza negro evito fazer de tolo, não desisto e insisto obter algum consolo.
Já a casa regressado, calço sapato apertado e vou correr meia hora.
De volta dessa corrida, esqueci o negro dia e os azares nele contidos. Afinal outras dores já ganharam primazia.
Um só acto me convém, os sapatos descalçar e desse alivio gozar.
Afinal que consolo... que belo dia...
O resto ? É virtual, já não lembra, não passou de fantasia.

sexta-feira, 4 de julho de 2008

(158) Entre muitos...

A solidão tem o seu êxtase






quando nos sentimos sós entre a multidão

(157) O quê... ou com quem!


De viagem a textos antigos, parei em:
Só passaram dois anos e, reconheço, sem me gabar, estou cada vez mais tolerante.
Do texto aos extensos arquivos da memória, lá fui buscar um processo com estrela, arquivado há algumas dezenas de anos.
Em tertúlia de café, uma mulher, rapariga então, afirmava no grupo que quando em relações sexuais o fulcro do interesse ia para o que estava a fazer e não com quem o fazia.
Revoltou-se o ser idealista nessa época residente no seio das minhas emoções, ainda cativo das reaccionárias ilusões que o caminho vai ceifando.
A afirmação era demasiado assertiva e avançada, numa época em que a mulher, por regra, reprimia as suas fantasias, obedecendo quase cegamente à pressão do grupo (menina séria não falava dessas coisas).
O reino era o da hipocrisia.
Embora ainda me penalize, aceito hoje, como já o fazia no texto de há dois anos, a razoabilidade do conceito daquela rapariga.
Todavia o ser ingénuo e emotivo, perene habitante do meu corpo, acredita ser possível, porventura pouco provável, unir num acto só a dualidade sexo e amor, despindo a natureza da sua manhosa mascara.