quinta-feira, 22 de novembro de 2007

(101) ERVILHAS


Não sou de grandes manjares, vos garanto e do prato me aproveito para suprir a obrigação imposta na caminhada.
Contudo, as ervilhas. Ah as ervilhas, e como gosto delas.
Não só pelo verde também pela textura.
Tanto delas gosto que nem faz sentido que as coma. Porém, hoje tem de ser.

A memória coloca na linha da frente um saboroso e divinal creme delas com que amiga minha me presenteia quando me convida a jantar. Lembra-me também a arrepiante dificuldade e rigor na confecção. É um espreme espreme e tira peles num longo espaço de tempo, estilo quebra paciências.
Uma canseira, quanto a mim inibidora da gostosura, espaço e tempo até com melhor proveito noutras artes.

Tento por isso reduzir o labor quando o desejo me vem.
Ah aqui está a lata. Basta um clique e até cozidas já estão.
Não deixam de ser doces e saborosas, porventura não tanto.
Satisfazem muito bem. A pele não lha tiro. Não resisto a peles macias.
P.S.: O prato foi alindado para a foto, não é regra.
Foram cinco minutos a preparar e pouco mais a mastigar.

quarta-feira, 21 de novembro de 2007

(100) POETAS

Tenho alma de poeta, disse alguém que visitou este meu canto.
Confuso, logo resolvi consultar, não o santo, antes minha rigorosa consciência e a alma, sua amiga de peito.
Sentido tenho andado por saber o pouco préstimo que me dão, apesar de mim se servirem, para se manifestarem por aqui.
Simples marioneta. Perdoo, não esqueço.
Todavia da conversa mais confuso fiquei, quando ouvi a sugestão por elas ali deixada.
Tenho agora de perguntar à minha visitante o que pensa ela dos poetas.
Enquanto não o souber estarei na ensombrada fronteira da dura critica ou elogio. Mais trilema que dilema.

sábado, 17 de novembro de 2007

(99) COMPAIXÃO



Domingo. Dia de graça. De hábito, quando por aqui estou, caminho cedo até à esplanada do Império, no jardim da Graça, e ali me quedo a saborear o veneno matinal. A bica.
Tenho a vantagem do reduzido bulIcio e de ainda escutar a passarada nos seus gorjeios enquanto se aprontam para mais um dia de voaradas.
Hoje, contra costume, assim não foi. Estava o reboliço instalado.
Caído no passeio estrebuchava um homem corpulento e de meia-idade, já rodeado de mirones e socorristas, não muitos, mas excessivos para aquela hora e dia.
Estava a ser chamada a ambulância.
Como de uso, sentei-me na esplanada, de costas para o efeito.
Não resisti a cuscar as conversas e sentenças que por ali já brotavam.
Mesmo aqui na terra e em dia de trânsito reduzido é sabido que as ambulâncias não voam. Sobrevoavam porém as criticas pelo seu atraso, pois já havia sido chamada, calculem, há cinco minutos.
Entretanto o homem, auxiliado e passada a crise aguda, sentara-se e repousava. Havia batido com o rosto no solo e sangrava ligeiramente.
A ambulância não tardou e foi o homem instado a ir ao hospital o que recusou veementemente.
Os profissionais respeitaram, pedindo apenas a sua recusa por escrito.
Saída dali a ambulância é que foi o delas.
Eram paletes a insistir com o homem para ir ao hospital e oferecendo-se até para o levar de táxi, sem pagar nada. Não faltavam os conselhos.
Todos tinham razão nas suas sentenças e todos esqueciam o desejo e a privacidade do verdadeiro interessado que se mantinha triste e calado.
A meu ver e vestindo-lhe a pele (que não é fácil), deveria era estar vexado e incomodado pelo seu sofrimento e mais aquele desaire, decerto não o primeiro, desejoso de ganhar forças para prosseguir o seu percurso.
Não está em causa a boa vontade dos mirones.
Porém onde cabe aqui a compaixão e o respeito pela vontade do outro ?

domingo, 11 de novembro de 2007

(98) CRUZES


"Aqui temos uma cruz a carregar homens"
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Quando o homem, por puro prazer ou na satisfação de uma qualquer primária necessidade, teve a ideia de cruzar dois troços de madeira, nem pela cabeça lhe passou a dor de cabeça legada aos vindouros.
Dizem as estatísticas e os entendidos que apenas cede a primazia ao circulo.
E quão diferentes eles são.

No circulo a continuidade da linha e na cruz duas linhas que jamais se encontrarão, se a perpendicularidade perfeita, o que é aproveitado para fazer significar na vertical o trilho do divino e na horizontal o mundano, mais fácil, mais aproveitado, trilhos distintos.
Os humanos necessitam e abusam dos símbolos na expressão dos seus sentimentos e daí o aproveitamento material da cruz.
Após o romano toque e a tão falada lavagem de mãos, foi criada a controvérsia e a cruz passou a pau para toda a obra. Deu a volta completa, como se de circulo se tratasse, e, de cruel punição do malfeitor, passou a suplicio de mártires e redenção por amor.
Materialmente simples artefacto, subjectiva e psicologicamente poderá representar tudo o que queiramos, passando à dependência do gosto e criatividade
Um pequeno passeio na net e mergulhamos numa profusão de formas para o mesmo objecto.

E em matemática ? A cruz é constante no sinal de mais, de tal maneira que dois menos e lá estamos a mais.
E se o homem estende lateralmente os braços ? Perfeita simulação da cruz, embora a intenção possa ter sido exercício de ginástica, gesto de desanimo por falta de soluções ou apenas um disfarçado espreguiçar. Podemos ainda sugerir tratar-se de algum presunçoso imitador com ganas de mártir.
O povo ainda diz que cada um carrega a sua cruz
Uns arrastando-a penosamente, em sofrimento aparente e num coro de lamentações.
Outros, já que tem de ser, tentam transportá-la de forma menos penosa.
Neste fatalismo de bons e maus, admitamos que todos carregamos a nossa por imposição ou não tanto.
Não sei como carrega a sua.
Eu tento levá-la ao pescoço.

(97) ORGASMOS

NECESSIDADES
A tal de natureza na sua intenção reprodutiva, prevendo o desinteresse individual, introduziu no acto o toque ao prazer e satisfação física, quebra de tensão, repouso e relaxe muscular.
FACILIDADES
Na espécie humana, por erro, porventura calculado, forneceu além do aparelho sexual, também um aparelho mental sofisticado.
Se foi para experiência, não resultou, ou talvez sim, dependendo das expectativas.
CAPACIDADES
De posse dessa facilitação, ganhou o humano avarias.
Alguns aplicam-se em perverter o acto, na esperança de aumentar o prazer permitido.
Outros diversificam e conseguem prazer de tipo mais variado, aliás mais duradouro e satisfatório.
EXEMPLO:
Esta manhã deambulando, deparei com a frase da foto, de autor que desconheço e a quem aqui presto mérito.
Ali tiveram inicio os preliminares deste meu orgasmo mental.
Excitei-me. Foi um dia em cheio no gozo das ideias.
Tem senãos, confesso.
O orgasmo, a existir em plenitude, necessita de complemento e partilha.
Neste meu caso, sem ser masturbação, é notoriamente solitário e sem muita esperança de contágio a quem, por mero acaso, leia o texto.
A mim satisfez, deu-me prazer desde os preliminares, preencheu espaço no tempo e poderei renovar o efeito cada vez que scrolar (passe a expressão) o meu blog.
Não termino sem afirmar o meu convicto envolvimento com e na natureza.
Persiste porém a dificuldade de me encontrar.

sexta-feira, 2 de novembro de 2007

(96) VAIDADES

fotocantodocarlos
No palácio das virtudes muitas queixas são recebidas sobre a conduta de seres desta espécie,

Constam elas do excesso de petulância, arrogância, altivez, agressividade e convencimento, entre obviamente muitas outras.

Na esperança de aclarar a origem de tais males, fui bem ao âmago.

Despi um sujeito das suas camuflagens e atavios, obrigatórios uns, postiços outros, e, creiam, nem de lupa em punho antevi causas para tal efeito.

Foi conclusivo o exame. Somos isto, pouco mais.

Todo o resto são efémeros poemas, vogando no espaço, a fazer de conta, e alguém cautelosamente vai cobrindo de poeira.

Sendo porém a ciência o que é, não querendo correr riscos e à cautela, não se trate de algum vírus, vou ali à farmácia procurar uma vacina.