domingo, 30 de julho de 2006

(29) O TESTAMENTO

E ali estava eu com o pé esquerdo pousado naquele belo e fofo solo azul celeste, polvilhado de algodão.
Êxtase e surpresa, não tanto pela inclusa sugestão da morte, mais pela benevolência da paradisíaca sentença.
Todos vamos cometendo erros na travessia e temeroso andava eu pelos fogos do outro lado, que com o calor não me dou.
Logo me passou na mente a ideia peregrina de, aproveitando o momento, lá pousar o outro pé e dar uma espreitadela.
Nessa querença e com crença, meti o pé direito e no consolo de o pousar... acordei !
Acordei aos pés da cama virado. Belisquei a coxa e doeu. Era tudo encenação e travessura de sonho bom.
Dei a volta completa e, paciente, aguardei o regresso da alma que, de seu hábito, tardava a voltar dos devaneios nocturnos para tomar conta deste corpo e prepará-lo para novo dia que de sol era, já alto e vestido a rigor.
Não deixou de ser belo o sonho enganador.
Passe a lisonja da absolvição, não deixou também de ser aviso da certeza do evento.
À cautela, e sem descuido, irei lavrar testamento dos dois lotes que me restam:
- o dos bens pela natureza emprestados e no percurso moderamente me serviram, vou legar a quem deles cuidar, recomendando o bom uso
- o do amor que me deram, encheu meu coração e deu luz ao tal percurso, esse, que me desculpem, decerto vou precisar e comigo vou levar